De mãe para filha
Já não posso te pegar ao colo, embalar teu sono, e cantar para afugentar qualquer nuvem perturbadora de teu repouso.
Estamos distantes.
Não foi a vida que nos separou, não, foi nosso desencontro espiritual, voltamos quando recém havias chegado entre nós, apenas um mês havia se passado quando, em nossa primeira ida ao pediatra, para acompanhar teu desenvolvimento, fomos vitimadas no acidente e para cá retornamos.
Foste apartada de mim, de imediato, não pude nem me despedir, mesmo sabendo todos que, ainda que tenha sido curto nosso convívio, eu já te amava desde que te descobri em meu ventre.
Muito tempo se passou, desde aquele momento, porém, para mim, mesmo com tudo que tenho aprendido, e todos os esclarecimentos que pacientemente recebo, não consigo deixar de sonhar em como teria sido nossa vida, como te desenvolverias, que roupas eu compraria para ti, como enfeitaria teus cabelos, as bonecas que te daria, as festas de aniversário, tua juventude, desenvolvimento, maturidade, meu envelhecimento, meus netos, enfim uma vida comum, compartilhada entre mãe e filha.
É muito difícil ficar com esta sensação do não vivido.
Eu já poderia ter retornado à matéria se tivesse superado o que aconteceu entre nós.
Para ti, provavelmente, nem em tua lembrança fiquei, pois eras um bebê, ainda que um espírito com sua bagagem vivencial.
Estou a conversar contigo, pela primeira e, quem sabe, última vez, já que ou estás para ir ou já voltaste a Terra.
Nada disto, agora, importa, pois tua imagem é fixa em mim, como se ainda permanecesses sugando meu seio ou, antes, ainda, chutando meu ventre.
Só queria ter tido a oportunidade de te ouvir me chamando “mamãe”, isto seria minha felicidade e, até com o que seria tua vozinha eu fico imaginando, a tal ponto que, em dados momentos, parece que te escuto.
Já estive recolhida ao hospital dos perturbados psíquicos, visto que entrei em estado de alheamento fixativo, me negando a interagir com os demais.
Não sei por quanto tempo ali fiquei, mas desde que tive alta vou lá regularmente, para acompanhamento.
Projetos eu não tenho, estou apenas fazendo a experiência de ser somente espírito, tentando compreender o que me dizem e aceitar que não posso alterar o que ocorreu entre nós.
Mesmo com tudo que sofri, com o desequilíbrio que vivi e, em alguns instantes ainda vivo, imaginando o inimaginável, desejo que, estejas onde estiveres, sejas feliz e recebas daquela que chamares “mamãe” o amor e o carinho que eu te daria.
Adeus.
Mariane
Recebida pela Magali em 29/04/2015
Revisão: Clovis